sexta-feira, 14 de janeiro de 2011

Aqui jaz

Odalina era de Maria e de Jesus. Incestuosa e maldito fruto do ventre da vida. Jazia perdida na cidade dos mortos como uma mulher da vida. Sempre outra em cada porto que percorro na tentativa vã de encontrar Marco Pólo. Viajante venusiano dos meus secretos desejos de possuir reinos e reis.
As cidades dos mortos são silenciosas e fechadas por portões e grades, correntes trancadas por cadeados mentirosos que simulam ser proibido entrar. As cidades dos mortos se abrem ao meu olhar desequilibrado e aprendiz de ladrão das sombras. Na revelação descubro que as luzes me assaltaram, fizeram refém e me mantêm cativa dos seus caprichos.
Eu desobedeço as leis e descubro o prazer de desperdiçar a película que me protege das altas definições. Não uso filtro solar e me exponho despudorada entre os túmulos que nem sempre guardam distância simétrica entre si. É um cemitério desordenado, sem caminhos definidos e passagens preservadas. Recobre a encosta da cidade, meio oculta e como um manto diáfano que revela a perversão do que não é para sempre, a vida.
Lugar onde não se ajusta contas com nada ou ninguém. Para onde o esquecimento, o anonimato e a infâmia nos conduzem como noivas suicidas. A solidão me toma de assalto e eu tento, em vão, fotografá-la. Odalina sorri. Maria se recolhe. E Jesus pende crucificado no terreno baldio da civilização.