sexta-feira, 13 de maio de 2011

Corrosão

Costura com o fio de aço da sensibilidade os farrapos do acaso que o olho peneira na trama fina do filó; remenda a seda macia do desatino com fiapos de razão, faz com os devaneios alucinados e crus do desejo uma colcha de retalhos. Pinta e borda a armadura da solidão.
Verte a sensibilidade ácida e corrosiva no ante oxidante do tempo. E deixa a pura ferrugem envergar o tesão e depor as armas sobre o cadáver ultrajado do guerreiro.
Sutura a minha pele dilacerada pela separação com a agulha pontiaguda da tua bússola desnorteada. E aquieta na tempestade do mar a calmaria do meu desespero.
Quando eu tentar me matar puxa como um titereiro o fio de aço com que seguras as rédeas da minha égua selvagem. Encena e insinua o prazer da primeira cavalgada. Mas não me faz voltar. Empina meu corpo como uma pipa no mastro da tua loucura e pela última vez me faz gozar ate (que) a morte (nos separe).

sábado, 7 de maio de 2011

Beija mão

Morde e assopra. Um arrepio horripilante separa o devaneio da vigília. Quando se fez a luz o mundo explodiu em sombras e o vermelho destilou amargura no pulso que não pulsava mais, azulava. Era a natureza soberana igual a si mesma e prisioneira do eterno retorno que submetia o meu olhar, mobilizava os sentidos e me deixava livre para ser senhora da dor.
Era um auto retrato? Era uma luva irreal que a pele da cobra escondida, o espelho deformado do mundo (des)encantado. Tudo guardado num barracão no Caju, perto do Encantado e à beira do mar.
Ele sugava sôfrego o instante. Ou se aproximava curioso da mão monstruosa do tempo no intervalo que separa a vida da morte. O cadáver ultrajado não reconhece o herói. O cadáver ultrajado é o testemunho da pegada maldosa do guerreiro. A infâmia de possuir o corpo morto do inimigo macula o herói com uma glória fugidia, anônima, calada e secreta como os sentimentos mais perversos que guardamos no fundo imundo da imaginação, no canto impuro da danação, no beco escuro e indigente dos amores perdidos e iluminados pelos fogos fátuos da paixão.