sábado, 7 de maio de 2011

Beija mão

Morde e assopra. Um arrepio horripilante separa o devaneio da vigília. Quando se fez a luz o mundo explodiu em sombras e o vermelho destilou amargura no pulso que não pulsava mais, azulava. Era a natureza soberana igual a si mesma e prisioneira do eterno retorno que submetia o meu olhar, mobilizava os sentidos e me deixava livre para ser senhora da dor.
Era um auto retrato? Era uma luva irreal que a pele da cobra escondida, o espelho deformado do mundo (des)encantado. Tudo guardado num barracão no Caju, perto do Encantado e à beira do mar.
Ele sugava sôfrego o instante. Ou se aproximava curioso da mão monstruosa do tempo no intervalo que separa a vida da morte. O cadáver ultrajado não reconhece o herói. O cadáver ultrajado é o testemunho da pegada maldosa do guerreiro. A infâmia de possuir o corpo morto do inimigo macula o herói com uma glória fugidia, anônima, calada e secreta como os sentimentos mais perversos que guardamos no fundo imundo da imaginação, no canto impuro da danação, no beco escuro e indigente dos amores perdidos e iluminados pelos fogos fátuos da paixão.

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