terça-feira, 1 de fevereiro de 2011

Modo random

O videoclipe danificado se repete em modo random no canal youtube da minha imaginação. Eu sou a platéia outra vez. Os olhos ressecam diante da tela e o corpo inteiro racha como se eu fosse o sertão. Uma aridez nordestina assola a intemperança do meu desejo sem destino que vem do sul. Eu rezo pela chuva. O inverno se esqueceu de partir e eu me perdi nas águas vivas da desilusão.
Mudo de posição: agora olho voyeur pelo buraco da fechadura. O videoclipe continua a passar enquanto eu aceno para a cativa da passagem que faz um strip-tease, antes que a abolição dos sentidos liberte todos os meus desejos escravizados no corpo dócil da complacência. Os botões e as teclas não me obedecem e você fala como um alucinado na frente da câmera manipulada pela voz de uma mulher modulada pelo desejo.
As tuas mãos falam e gesticulam uma insanidade que se esconde nos bolsos da camisa e da calça. Fazem desaparecer, como se pertencessem a um ilusionista, a timidez e o temor que se escondem entre as pernas enquanto produzem uma sonora ereção.
Eu te vejo mágico de si mesmo a se reinventar no discurso que como um álibi é declamado no púlpito para redenção dos infiéis ao pensamento livre, os anônimos e encarcerados prisioneiros do FUI.
O videoclipe frita meu pensamento, como uma frigideira num forno de microondas, calcina sem deixar vestígios e meus olhos ficam estatelados como duas gemas esverdeadas fixadas morbidamente nas imagens que as palavras projetam na tela líquida da minha pele. Redescubro o tempo perdido que a tua lembrança acendeu em mim.
Os botões e as teclas não me obedecem e neste momento tento desabotoá-los para te despistar da repetição. Mas o desejo é vão.
O devir das tuas palavras, como uma cabeça d’água me inebria e afoga, me arrebata na corredeira fatal da retórica, me embebeda de alucinações sujas e me cobre com a mortalha dos versos de amor que o tempo usurpou, como se fossem proibidos, como se não fossem meus, como se fosse eu a ladra do teu coração.
Eu em modo random me repito aleatória na tua frente e fico rubra de vergonha quando teu olhar atento esquarteja a fragilidade do meu delicado gesto de adeus enquanto desligo o celular.

Um comentário:

  1. EM CARNE VIVA DIANTE DA TELA, AQUILO QUE NÃO SE VÊ SÓ SE SENTE... LINDO!!!
    ESTAVAS COM A ALMA NUA???
    SEM PROTEÇÃO, SEM PENA DE TI, LINDO!!!

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